Nesta coletânea de 27 narrativas brasileiras de horror escritas ao longo de sessenta anos, os organizadores Júlio França e Oscar Nestarez provam que a ficção do século 19 não se restringiu ao romantismo, ao realismo e a outros movimentos reconhecidos pela historiografia literária tradicional. Enquanto a crítica se voltava para o projeto nacional indianista e afirmava que Álvares de Azevedo e seu Noite na taverna eram um caso isolado, poéticas negativas corriam à margem. Os contos obscuros reunidos neste livro, colhidos após minuciosa pesquisa, mostram que, além da temática tenebrosa, outra escuridão durante muito tempo os acometeu: nunca haviam sido contemplados pelas luzes da crítica literária, permanecendo ocultos até mesmo dos leitores do gênero.
Em apresentação ao livro, os organizadores abordam os motivos que levaram ao apagamento histórico de um gênero tão popular na contemporaneidade. Além disso, eles apontam a importância de uma leitura crítica dessas narrativas que, na qualidade de textos históricos, dão a conhecer traços constitutivos da nossa sociedade — como o machismo estrutural, que excluiu do cânone literário mulheres escritoras que há muito tempo produziam, e o racismo escravocrata, que permeia essas histórias oitocentistas e avança até o Brasil do século 21.
Por meio do critério cronológico, cobrem-se as mais diversas vertentes sinistras, sejam elas o gótico, o horror, o fantástico ou as histórias de crime. Machado de Assis, Olavo Bilac, Júlia Lopes de Almeida e Aluísio Azevedo são algumas das presenças célebres que mostram a prática brasileira do gênero fora de um suposto nicho. Outros autores, menos conhecidos, mas igualmente assustadores, povoam a edição com feiticeiras, cometas apocalípticos, crimes conjugais, vinganças, florestas encantadas, fantasmas, homens possuídos, monstros flamejantes, vampiras e outros personagens escabrosos. É vasto o panorama dos que rompiam as convenções e provocavam prazer estético com o medo.