Um mergulho na paisagem e na cultura do Haiti em um dos romances mais importantes do país. Senhores do orvalho traz uma história de amor, de valorização da cultura negra haitiana e da ancestralidade, da luta contra a fome e a miséria, do combate contra todas as formas de opressão
Uma das obras fundadoras da literatura haitiana, Senhores do orvalho, de Jacques Roumain (1907-1944), é uma história de valorização da cultura negra do Haiti, de sua língua, sua paisagem, sua tradição e religião, o vodu. Mas é também uma história de amor e de luta, de discussão sobre tradição e modernidade, opressão e solidariedade.
O romance, traduzido em dezenas de línguas, tem como protagonista Manuel, que volta para seu povoado no Haiti depois de quinze anos vivendo em Cuba como cortador de cana. Ao retornar, a paisagem que encontra em Fonds-Rouge não é a mesma: após décadas de desmatamento, a terra está seca, as fontes de água desapareceram, e a população padece da miséria e da fome. Além disso, uma briga entre famílias locais criou uma rivalidade incontornável, e os moradores, que sempre trabalharam a terra coletivamente, com a tradicional coumbite, estavam desunidos. É nesse contexto que Manuel surge como uma espécie de herói, para, entre a experiência adquirida com os trabalhadores cubanos e um mergulho nas tradições ancestrais, tentar unir sua gente e encontrar uma solução para a miséria.
Exemplar máximo do movimento artístico Indigenista, do qual Jacques Roumain foi um dos fundadores, o livro, que adota o francês crioulizado como linguagem, é emblemático ao ir além do programa estético indigenista. Roumain, nesta que é a sua obra-prima, usa a literatura não apenas para exaltar paisagem e cultura haitianas, valorizando suas raízes africanas, mas agrega a isso uma análise dessas práticas ancestrais e suas contradições. Na figura de Manuel, o romance discute a necessidade da adesão de sociedades como a haitiana a uma forma de organização política e social que lute pela liberação contra a exploração colonial e capitalista.
O livro, que só tinha tido uma edição no Brasil em 1954, em uma coleção coordenada pelo escritor Jorge Amado, ganhou nova tradução, por Monica Stahel, e vem acompanhado de um posfácio escrito por Eurídice Figueiredo, professora do da Universidade Federal Fluminense e especialista em literatura haitiana. O livro eletrônico se baseou no projeto gráfico da edição impressa, feito pela Casa 36, dos designers Camila Lisbôa e Fernando Iervolino.